Estudo mapeia erosão e outros eventos no litoral sul de Sergipe

Praias do Saco, do Abaís e da Caueira apresentaram trechos com erosão extrema

A igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, localizada na praia do Saco, precisou de medidas emergenciais para não ser destruída pelo recuo da praia. (Foto: Acervo LACMA/ PGAB-UFS 2018)
A igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, localizada na praia do Saco, precisou de medidas emergenciais para não ser destruída pelo recuo da praia. (Foto: Acervo LACMA/ PGAB-UFS 2018)

O litoral brasileiro tem mais de 7 mil quilômetros de extensão, entre muitas formações, como belíssimas praias e ricos mangues, abrigando importantes e biodiversos bens territoriais. Entretanto, mais da metade disso tem sido gradativamente destruída, seja pelo acúmulo de sedimentos, ou pela erosão.
A erosão é uma perda de sedimentos do solo, provocada por agentes naturais como a água, o vento e outros eventos. Na zona costeira, os principais agentes são as ondas, os ventos, as marés e as correntes marítimas.
Esses processos se intensificam com a ação humana e atingem hoje cerca de 60% do litoral brasileiro, de acordo com o livro Panorama da Erosão Costeira no Brasil, lançado 2018 pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) do Brasil.
A linha de costa, que é a linha que faz a separação entre o mar e a terra se origina de um processo espontâneo da natureza, somado às intervenções humanas - podendo haver implicações quando essas atividades se dão indiscriminadamente e sem planejamento. Esse tema gera preocupação de cientistas no mundo todo e estudos são feitos para obter dados sobre a erosão costeira e seus impactos.
O pesquisador João Paulo Santos fez um mapeamento e analisou a linha de costa do litoral sul de Sergipe, mais especificamente, das praias do Saco, do Abaís e da Caueira.
Ele concluiu que, “em uma comparação com o cenário mundial, as praias do sul de Sergipe apresentaram trechos com erosão extrema, mesmo não experimentando eventos de tempestade ou elevação do nível do mar”.
O cenário mais grave é na praia do Saco, cujo comportamento da linha de costa foi de erosão extrema, erosão e acresção (avanço da linha de costa). A praia do Abaís apresentou trechos em estabilidade e acresção, e a praia da Caueira mostrou comportamento de estabilidade, erosão e erosão intensa.
Zona costeira do sul de Sergipe
João Paulo Santos concluiu seu mestrado no Programa de Pós-Graduação em Geociências e Análises de Bacias pela UFS, orientado pela professora Ana Cláudia da Silva Andrade e coorientado por Paulo Sérgio de Rezende Nascimento. Ele conta que seu trabalho, além de caracterizar os indicadores e estágios de erosão, realizou um cálculo da taxa de variação da linha de costa do período de 1971 até 2017.
“Esse cálculo permite estabelecer, em metros por ano, o quanto erodiu e o quanto ‘progradou’ nessas praias”, comenta, acrescentando que em Sergipe há poucos dados e quase nenhuma pesquisa voltados para o assunto.
“Há trabalhos mais antigos realizados no litoral sul de Sergipe, mas só expressaram dados qualitativos, ou seja, só indicavam quais trechos da linha de costa estavam sob erosão ou acresção, mas não quantificaram. Com a técnica usada nesse trabalho de mestrado, ninguém havia feito no litoral sul do estado”.
João Paulo explica que nas últimas décadas tem sido muito enfatizada a erosão nos locais analisados. “Desde 2007 as perdas por erosão começaram a ser noticiadas no litoral sul de Sergipe. A partir desta data, órgãos públicos e moradores locais têm feito esforços para conter essas perdas por erosão. Em 2018, um caso bastante agravante foi relacionado à Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem, localizada na praia do Saco. Neste local, os órgãos públicos tiveram que realizar medidas emergenciais para conter o recuo da praia que está ameaçando destruir a capela”, conta.
Drones e imagens de satélite para documentar
O trabalho foi realizado através de um mapeamento da linha de costa das praias utilizando fotografias aéreas e imagens de satélite, do período de 1971 até 2017. O período escolhido deve-se a alguns fatores, como o fato de que as fotografias dos anos anteriores não estavam em escala satisfatória. Além disso, permitiu observar o avanço da ocupação nessa área.
egundo João Paulo, o material analisado agora faz parte do acervo do LACMA, vinculado ao PGAB-UFS. Além disso, foram feitas visitas de campo nestas praias durante o período da pesquisa para avaliar a situação das perdas por erosão. A análise do comportamento da linha de costa possibilitou quantificar e estimar, em porcentagem, quais trechos, dessas praias, estariam experimentando erosão, acresção e quais ficaram em estabilidade. Os dados dessa análise foram constatados pelos registros das visitas de campo.
Com isso, foram apontados os problemas em consequência da junção da erosão com atividades antrópicas e, também, trouxe propostas para auxiliar nos problemas encontrados.
Problemas socioambientais
Muitas vezes as construções feitas próximas a linha de costa ocorreram de forma indevida, e, então, por consequência, quando ocorre a erosão, essas obras podem ter complicações. João Paulo conta que esse ano a ação civil determinou que fosse feito uma regulamentação ambiental das construções próximas a praia do Saco.

Variação da linha de costa entre 1971 a 2017 nas praias do Saco e Abaís. (Foto: Acervo LACMA / PGAB-UFS)
Variação da linha de costa entre 1971 a 2017 nas praias do Saco e Abaís. (Foto: Acervo LACMA / PGAB-UFS)

“Houve solicitação junto ao Ministério Público Federal para que construções fossem demolidas, mas a justiça decidiu que só vai analisar essas solicitações mediante o resultado de perícias judiciais. Também ocorreram sessões plenárias para o plano e minuta do projeto de lei para políticas de gerenciamento costeiro de Sergipe favorecidas pela GERCO [Coordenação Estadual do Programa de Gerenciamento Costeiro]. Acompanhei duas dessas sessões, onde também estava presente a associação de moradores locais, e eles pediram aos órgãos públicos locais uma mediação quanto a decisão do Ministério Público Federal sobre as possíveis remoções de construções, muitas delas residências, as quais muitos moradores são de baixa renda e moram há gerações naquele local”, relata.
Além disso, as praias têm estruturas e atividades diferentes, são modificadas por diferentes processos. É o caso da praia do Saco.
“A praia do Saco, por ser uma praia de desembocadura fluvial, é caracterizada por uma dinâmica de erosão e acresção bastante intensa. Entre os fatores que contribuem para esse dinamismo intenso, se destacam a presença de acumulações de sedimentos em forma de grandes barras arenosas, conhecidos como deltas de maré vazante. Essas barras variam, com o tempo, de tamanho e posição. Estas modificações influenciam diretamente sobre a linha de costa desta praia. O meu trabalho analisou as alterações do posicionamento e extensão dos deltas de maré vazante nesta desembocadura fluvial”, disserta.
Diante disso, construções indevidas feitas sem nenhum mapeamento da área, quando ocorre a erosão podem sofrer com diversos problemas que comprometem a estrutura das obras.
João Paulo explica que, muitas vezes, devido à especulação imobiliária, as pessoas ocupam e constroem em áreas muito próximas às dunas, por exemplo, “o que não era para acontecer, diante da legislação vigente; então constroem ali indevidamente e o ciclo da natureza não interrompe para agradar ninguém, o processo de erosão continua e avança mesmo que haja uma construção no local”.

Variação da linha de costa entre 1971 a 2017 na praia da Caueira. (Foto: Acervo LACMA / PGAB-UFS)
Variação da linha de costa entre 1971 a 2017 na praia da Caueira. (Foto: Acervo LACMA / PGAB-UFS)

Outro grave fator, de acordo com João Paulo, “está no rebaixamento do perfil da praia, observado nas praias com o enrocamentos de rocha, como em trechos da praia da Caueira. Este rebaixamento do nível da praia pode impedir sua recuperação e, como consequência, temos o desaparecimento completo da praia em período de maré cheia, tal como ocorre na praia da Caueira”. Essa implicação é caracterizada como conflito de uso, ou seja, a praia que antes era destinada ao lazer, pode perder esta finalidade.
João Paulo comenta que o monitoramento costeiro deve ser contínuo, já que “esses cenários de erosão e acresção mudam no tempo e no espaço, ou seja, taxas de variação e o comportamento dessas praias podem modificar”.
Por isso, novos dados a respeito da variação da linha de costa devem ser levantados periodicamente e as faixas de proteção construídas devem ser refinadas. Ele acrescenta que uma combinação de metodologia de faixas de proteção pode ser utilizada.
“Existem métodos que levam em consideração dados da estimativa do possível aumento do nível do mar, sendo recomendados para projetos de gestão a médio e a longo prazo”, conclui.

FONTE: Portal UFS





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