Ruínas de Atafona: Histórias de famílias levadas pelas águas do mar (RJ)

Balneário recebe pesquisadores que tentam desvendar o avanço do mar | Foto: Mauro Souza
“Minha mãe estava passando roupa quando o mar invadiu a nossa casa. Meu pai teve que pular a janela para me tirar do berço”, a história de Nilda faz parte de milhares que com o passar do tempo ficaram na memória de muitos moradores de Atafona. Atualmente o cenário de destruição do balneário ilustra a força da natureza, e ao mesmo tempo chama a atenção de turistas e pesquisadores.

Atafona fica no norte do Estado, junto com Grussaí e Açu compõe o litoral da pacata São João da Barra. O município que hoje vive em fase de desenvolvimento e o mar esconde construções e histórias.

Na década de 80, Atafona era considerada a menina dos olhos do município. Grandes casarios e vivendas foram construídos no local por famílias ricas da região. Todos os usineiros tinham lá, as suas mansões de veraneio. Mas ainda hoje famílias de cidades vizinhas escolhem o balneário para passar a estação mais quente do ano.




A destruição continua presente em Atafona a cada onda do mar de cor amarronzada, as vezes verde, depende de como o vento sopra. A maresia corroí grades, fechaduras e janelas feitas há décadas de ferro ou madeira. O tempo faz com que esses materiais fiquem iguais a folhas de papel, que com apenas um toque desmancham ou quebram.

A dona de casa Nilda Rodrigues, é nascida e criada no balneário, os pais já falecidos contavam histórias de grandiosas e humildes residências, que foram erguidas onde hoje esta o mar.



“Nós morávamos a perder de vista daqui. Mas o mar tomou tudo, minha mãe contava que estava passando roupa quando o mar invadiu nossa casa. Meu pai teve que pular a janela para me tirar do berço. Eles construíram uma casa às pressas, enquanto ficamos na casa dos meus avós. Depois não quiseram reformar a nova casa com medo do mar um dia chegar lá também”, disse.

Em meio a um tronco de árvore seco a dona de casa brinca com dois de seus três filhos e se diz triste quando olha o cenário de destruição.

“Eu cresci aqui, brincava ali no prédio do Julinho e vi o dia em que ele desabou com a força da água. Estava de longe olhando com o meu filho, mas a sensação de tristeza era muito grande”, comentou.




A força do vento cria dunas ao longo da orla, mas algumas dunas já invadiram casas. Cômodos, janelas e quintais foram tomados pela grande quantidade de areia.

Bem ao lado de um dos montes está a casa de Ricardo Cardoso, o comandante da Marinha Mercante escolheu Atafona para morar há mais de uma década e viu as mudanças que a natureza provocou na paisagem.



“Quando vim morar aqui tinha mais uma rua na frente da minha, com o tempo o mar já chegou aqui no meu quintal e até derrubou o muro. A areia margeou a casa, tive que contratar uma máquina para empurrá-la novamente para mais próximo da água”, citou.

O medo que o mar volte a avançar existe, mas não é maior do que a vontade de continuar morando no local. “Não quero sair, amo essa parte de Atafona. Espero que façam alguma coisa para salvar a fileira de casas que existe aqui”, pediu.



No lugar onde o Rio Paraíba encontra o mar, o clima é harmônico, enquanto as crianças se divertem na água, sob o olhar atento das mães e tias, os pais aproveitam para pescar.




O comerciante Silmar saiu de Campos para pescar nas águas do Pontal e aproveita a maré para pegar o maior número de peixes.

“Aqui é ótimo, além de ser muito bom para pegar peixe é tranquilo. As espécies são roncador e bagre”, comentou rapidamente Silmar Antonio Viana, enquanto tirava mais um peixe da água.

No fim de mais um dia de trabalho, os pescadores desligam os motores de seus barcos. Em contraste com o mangue e o por do sol, as embarcações ficam ancoradas a espera de mais uma madrugada, para ir ao oceano e trazer grande quantidade de pescado que é vendido ali mesmo ou nos mercados sanjoanenses.



PESQUISAS E TURISTAS

De acordo com o professor do Departamento de Engenharia Cartográfica da UERJ e do Setor Geoambiental da Universidade Federal Fluminense (UFF), Gilberto Pessanha de 2000 até 2006 houve a diminuição de um terço na área dos manguezais nos municípios de São João da Barra e São Francisco do Itabapoana. “Grande parte desses manguezais foram invadidos com casas e barzinhos, como é o caso do Pontal de Atafona” disse.



Segundo Pessanha, os bancos de areia nas praias de Atafona vêm do Rio Paraíba e esses bancos acabam inibindo a força das ondas, por isso a impressão de que o mar está se afastando.

“Desde 1954 já foram perdidas uma área de 60 campos de futebol. Nós temos fotos aéreas dessa época que nós comparamos com atuais”, explicou.

Gilberto informou que desde quando a erosão de Atafona começou a ser divulgada na mídia houve um aumento no número de ônibus de turismo para a região. “As pessoas vêm cheias de curiosidade para saber o que aconteceu com o litoral de São João da Barra. A área mais destruída fica entre a Caixa d’água até o Pontal”, finalizou.

Comentários

jpimentel disse…
1978. Foi neste ano que a residência da minha família foi levada pelo mar. Ela ficava exatamente atrás da Capelinha de Nossa Senhora dos Navegantes. O meu pai comprou em 1956 uma casa de sapê de pescador, desmachou e construiu uma outra de alvenaria. Foram 22 verões inesquecíveis passados na casa, nos primeiros sob a luz de lampião, lamparina, vela e bomba d'água manual. Valeu!

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