Alargamento de praias avança em Santa Catarina com danos ao ambiente, pois pode prejudicar a biodiversidade

 Por Redação O Sul


Obra de alargamento da Praia Central, no Balneário Camboriú. (Foto: Divulgação/PMBC)

O alargamento de praias é feito em vários pontos do litoral do País, mas Santa Catarina virou referência nesse tipo de intervenção, dada a popularidade do destino turístico e a repercussão que mudanças em seu litoral ganham nas redes sociais. Na última semana, obras de outra engorda da faixa de areia foram iniciadas na praia de Jurerê, Florianópolis.

Se, por um lado, as mudanças climáticas aumentam os problemas de avanço da maré e erosão costeira, especialistas dizem, em contrapartida, que essa estratégia tem vida útil curta. Eles veem riscos para os próximos anos, como a criação de “degraus” na areia e danos à biodiversidade marinha.

A prefeitura de Florianópolis destaca que a fase de análise dos impactos socioambientais dura mais do que a própria obra e ressalta haver monitoramento de biólogos. Também diz que outras intervenções similares, como nas praias de Canasvieiras (2020) e Ingleses (2023), não apresentaram efeitos negativos.

Maior engorda

A obra em Jurerê prevê aumentar a faixa de areia em 3,38 km – a maior engorda já feita na cidade, sob justificativa de evitar riscos a banhistas e moradores. O volume dragado previsto é de 491,2 mil m³ de areia e, após a intervenção, uma faixa de 30 m, ao custo orçado de R$ 25 milhões.

Em outubro de 2023, um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) assinou nota técnica em que defende rever o uso dessa engenharia no litoral. Um dos problemas, dizem eles, é a falta de compreensão completa sobre os efeitos que a engorda têm nas áreas do entorno.

“Esse tipo de empreendimento é, em seu âmago, de impacto regional. Todas as praias são conectadas, e o que se faz em uma afeta as do entorno”, diz o professor de Oceanografia Paulo Roberto Pagliosa, um dos pesquisadores que assinam o documento.

A ameaça à atividade pesqueira também é uma preocupação de parte dos especialistas. Para os pesquisadores da UFSC, obras desse tipo devem ter exigências de intervenção de grande porte.

“É dragado o fundo marinho, que tem uma biodiversidade que a gente desconhece. E uma série de poluentes, cistos de algas que fazem marés vermelhas ou algas nocivas”, diz Paulo Horta Junior, pesquisador do Laboratório de Ficologia (de estudo das algas) da Federal de Santa Catarina.

Maré vermelha é um fenômeno causado pela proliferação excessiva de algas, sobretudo de espécies tóxicas. Nesta semana, mais de 300 pessoas buscaram atendimento médico em Alagoas e Pernambuco com suspeita de intoxicação após terem contato com algas em um episódio desse tipo.

Atrativo

A simplicidade relativa dos alargamentos os torna atraentes. É uma obra menos complexa, por exemplo, que construir estruturas de pedras, projetadas para reter a areia movimentada pelas marés.

Muitas cidades litorâneas têm apostado em estratégias diversas para conter o avanço das ondas fortes, como muros de pedra e barreiras submersas. Especialistas afirmam que, com o aquecimento global, haverá alta do nível do mar e ressacas mais frequentes e severas.

A nota técnica dos pesquisadores da UFSC ressalta que o alargamento não mira as causas da erosão. Isso, segundo Pagliosa, encurta a vida útil e diminui a eficácia dos projetos. “Será que queremos produzir uma praia artificial constantemente?”, questiona.

Uma alternativa, sugerem os estudiosos, é a transferência progressiva de construções próximas à praia para áreas mais distantes e elevadas, combinada com a restauração do ecossistema para proteger a costa — e recuperar a restinga, vegetação ao longo do litoral.

“A remoção das estruturas da região próxima pode ser muito mais efetiva do que tentar dominar a natureza, que é a ideia do aterro”, pondera o professor.

Muitas das orlas, porém, já são ocupadas, inclusive por condomínios ou edifícios de alto padrão, o que dificulta o esvaziamento das áreas.

Balneário Camboriú

Em Balneário Camboriú, uma das mais badaladas do Sul do País, a Praia Central teve a faixa de areia alargada em 2021, de 25 para 70 m. Antes, com o estreitamento do local, os prédios faziam sombra na orla, o que reduzia o tempo que banhistas podiam desfrutar do sol. Após a intervenção, o aparecimento de um degrau íngreme na praia incomodou banhistas. À época, a prefeitura atribuiu o problema às fortes ressacas e disse que o projeto já previa eventuais reposições de areia. Mais tarde, a cidade recorreu a geotubos para conter o problema.

Um dos primeiros alargamentos de praia do Brasil foi em Copacabana, no Rio, que passou pela engorda entre 1969 e 1970. Com a mudança, estima-se que a faixa de areia foi de 55 para 140 metros.

FONTE: O SUL




Comentários

Mais visitados