Retomando o seu lugar (RN)

A ocupação pelo homem de um espaço anteriormente preenchido pelo mar, configura-se como uma das causas do processo erosivo das praias urbanas de Natal. O avanço do mar tem sido a principal consequência da erosão costeira que não se restringe, porém, somente às praias localizadas na capital e está também presente em quase todo o litoral potiguar. O descumprimento de leis ambientais e a instalação de moradias e comércios em áreas com menos de 50 metros de distância da linha do mar, tem ocasionado cenas como as que são comumente vistas em praias como Ponta Negra, Artistas e do Meio. Calçadões rachados, destruídos em alguns pontos e a água do mar travando uma "guerra" entre as estruturas de concreto armadas pelo Município com o intuito de conter o avanço das águas.

Em Graçandu (foto), litoral Norte do RN, e em Ponta Negra, a força da maré tem mostrado o mesmo resultado: destruição em busca do espaço perdido. Foto: Alex Régis
Sem estudos adequados e implementação de mecanismos corretos de contenção, todo o serviço será em vão. É desta forma que a coordenadora do Laboratório de Geologia Marinha da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Helenice Vital, analisa o progresso da erosão nas praias potiguares, principalmente aquelas localizadas em Natal. Para ela, as obras realizadas nos últimos anos nos calçadões são "paliativas". "É preciso que haja um trabalho conjunto da Prefeitura de Natal, do Governo do Estado com a UFRN para que seja elaborado um complexo estudo das áreas que sofrem processos erosivos", ressaltou a professora. Ela explicou que o maior problema no estado não é o avanço do mar em si, mas a falta de carreio de sedimentos do rio para o mar.

"O processo erosivo é a perda de terra. O nível do mar que é mutante, para haver um equilíbrio, o rio deveria trazer sedimentos e o mar se encarregar de distribuí-los", explicou Helenice Vital. O sedimento ao qual a pesquisadora faz referência, é areia, que em regiões com rios caudalosos, corre para o mar numa quantidade suficiente para evitar a erosão da zona costeira. Helenice Vital disse, ainda, que existem duas soluções para o problema da erosão nas praias potiguares: a construção de braços de pedra, como os erguidos em Areia Preta, por exemplo, ou ainda a colocação de areia no próprio banco de areia da praia. Esta segunda possibilidade, de acordo com a professora, foi adotada no Rio de Janeiro para manter a praia de Copacabana com as características que ela tem hoje.

"Para isto, porém, é preciso que um estudo seja bem elaborado. É preciso medir a velocidade dos ventos, a altura das ondas, a direção das correntes marítimas", ressaltou. Ela citou, como exemplo positivo, o braço de pedra construído na praia de Areia Preta, realizado com base em um estudo acadêmico. O único problema identificado nas obras feitas naquela praia, foi a ausência de um banco de areia submerso que constava no projeto original e não foi executado por falta de recursos. Os braços de pedra que não funcionaram, pois não seguiram padrões especificados em estudos preliminares, foram erguidos e posteriormente destruídos pela própria movimentação das marés em Caiçara do Norte, litoral Norte do estado.

Baseada em fotografias e estudos geológicos, Helenice Vital apontou que as construções ao longo das avenidas Erivan França, em Ponta Negra, e Getúlio Vargas, em Petrópolis, não deveriam existir. "Aquelas são áreas mais altas que a gente vê hoje preenchida com prédios, são na realidade falésias. Um dos sinais de que o mar ocupava aquela área no passado", enfatizou a pesquisadora. De acordo com pesquisas do Laboratório de Geologia Marinha da UFRN, o nível do mar que banha a costa potiguar baixou três metros ao longo de sete mil anos. "Isto comprova que nós ocupamos uma área que era do mar. Além disso, o mar não está avançando. Falta sedimentação. Os trabalhos de reparos nos calçadões não irão suportar a energia desprendida pela quebra das ondas e irão romper novamente", advertiu Helenice Vital.

Alteração atmosférica gerou mudanças climáticas

A seca que assola a maioria dos estados nordestinos tem uma explicação científica prática. De acordo com o professor do Departamento de Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP), Tércio Ambrizzi, a atmosfera passou por um processo de aquecimento ao longo dos últimos anos que refletiu na ocorrência de extremos climáticos. Além disso, nem mesmos nas regiões com as quatro estações definidas, está ocorrendo uma variação média de temperatura incomum.

O professor explicou que a ausência de chuvas no Nordeste e concentração das precipitações na região Norte do país resultam da movimentação das zonas de convergência. "A temperatura das águas do Atlântico Norte estão mais quentes e a zona de convergência intertropical está mais concentrada ao Norte do país". Ou seja, as chuvas mais intensas em uma única região inibem a formação de nuvens em outras localidades, aumentando, inclusive, a sensação de radiação (calor).

Sobre a previsão de um inverno regular no Rio Grande do Norte, o que acabou não ocorrendo e o cenário de seca se formou em quase todos os municípios potiguares, o pesquisador disse que a tendência de acerto dos estudos meteorológicos é considerada satisfatória. Entretanto, fez uma ressalva. "Só não é possível prevermos uma super seca. Isto envolve uma série de fatores, como a quantificação de quanto vai chover. Ainda não somos capazes de prever isto", argumentou.

Para que esta previsão fosse possível, ele disse que seriam necessários investimentos na compra de novos instrumentos de medição de clima e modelos de revisão das previsões.

Desertificação

O processo de desertificação do semiárido nordestino foi discutido no Simposium Climate Change, Impacts and Vulnerabilities in Brazil (Simpósio Mudanças Climáticas - Impactos e Vulnerabilidades no Brasil, em tradução livre) promovidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte durante esta semana no Hotel Parque da Costeira, na Via Costeira.

Além do Rio Grande do Norte, a Paraíba, o Ceará, Pernambuco e Bahia, apresentam áreas em processo de degradação ambiental (desertificação). De acordo com o professor do Instituto de Ciências Atmosféricas da Universidade Federal de Alagoas, Humberto Barbosa, a seca e a desertificação são processos silenciosos que estão em conexão.

As áreas nas quais no passado eram preenchidas pela caatinga, vegetação natural do semiárido nordestino, hoje sofrem as consequências do extrativismo para produção de lenha, que ainda alimenta, no Rio Grande do Norte, a indústria ceramista e algumas padarias da capital e do interior. "A degradação da área se caracteriza pela perda vegetativa e, consequentemente, da produtividade. São estas as principais características da desertificação", analisou o professor.

Segundo Humberto Barbosa, é possível restaurar áreas degradadas. "É preciso que se faça um estudo do solo, o reconhecimento da vegetação nativa e o (re)plantio da caatinga". Além disso, ele avaliou que é preciso monitorar o processo de desertificação in loco ou via satélite, com fotografias. Atualmente, o Instituto Nacional do Semiárido atua no mapeamento e monitoração das áreas degradadas no Nordeste.

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