Podem tempestades extremas proteger praias da subida do nível do mar?

 Tempestades extremas, cada vez mais frequentes devido às alterações climáticas, causam danos no litoral, dunas, bens e infraestruturas. Mas, pelos vistos, também há um lado positivo, pois ajudam a proteger as praias do impacto da subida do nível do mar. Como? Saiba mais aqui!

O lado positivo das tempestades extremas poderá ser fundamental para compensar os efeitos das alterações climáticas, nomeadamente no que toca ao recuo da linha costeira. Como?

A natureza surpreende-nos em muitas ocasiões. As tempestades extremas, cada vez mais frequentes devido às alterações climáticas, causam danos no litoral, dunas, bens e infraestruturas. Mas os cientistas acabam de descobrir o seu outro lado positivo: ajudam a proteger as praias do impacto da subida do nível do mar, já que arrastam areia nova de águas mais profundas ou de praias próximas.

estudo, que abre um novo olhar sobre tempestades extremas, foi conduzido por Mitchell Harley do Laboratório de Investigação da Água da Universidade de New South Wales e publicado no Nature Communications Earth & Environment.

"Sabemos que tempestades extremas provocam uma erosão costeira extensa e danos nas propriedades da orla marítima. Mas pela primeira vez olhámos não só acima da água, onde os impactos de tempestades extremas são fáceis de ver, mas também abaixo da água", indica Harley. O que os investigadores descobriram foi que centenas de milhares de metros cúbicos de areia entram nos sistemas de praia durante estes eventos, semelhante à escala que os engenheiros utilizam para alimentar artificialmente uma praia.

Uma nova forma de olhar para as tempestades extremas

Segundo Harley, “isto poderá ser suficiente para compensar alguns dos impactos da subida do nível do mar causada pelas alterações climáticas (estimada em 0,63 a 1,01 metros até 2100), tais como o recuo costeiro. Mesmo a longo prazo. É uma nova forma de ver as tempestades extremas", diz Harley.

O arrasto de areias do mar profundo causado por tempestades extremas poderá compensar efeitos das alterações climáticas, tais como a erosão costeira, protegendo praias da subida no nível do mar.

Em colaboração com investigadores da Universidade de Plymouth e da Universidade Autónoma de Baja California, o estudo examinou três áreas costeiras: uma na Austrália, outra no Reino Unido e outra no México. Cada uma foi sujeita a uma sequência de tempestades extremas, seguidas de um período mais ameno de recuperação da praia.

Perdas muito significativas de areia

Na Austrália, estudaram Narrabeen Beach em Sydney, após uma tempestade que, em 2016, arrancou uma piscina de uma propriedade privada com vista para a costa, entre outros danos. Através de medições de alta resolução da praia e do fundo marinho, os cientistas mostraram que os ganhos de sedimentos eram "suficientes para teoricamente compensar décadas de retrocesso da linha costeira projetada". Recorrendo a equipamento de monitorização especializado, conseguiram obter medições precisas antes e depois de uma tempestade, tendo descoberto a quantidade de areia que se deslocava em cada tempestade.

"Não sabemos bem de onde vem esta areia adicional, seja de praias próximas, águas profundas ou ambas ao mesmo tempo, mas compreendemos agora que ondas extremas podem potencialmente contribuir positivamente para a quantidade de areia, apesar de causarem erosão das dunas e praia superior" - Gerd Masselink, professor e participante neste estudo.

No Reino Unido, desde 2006 que os investigadores analisam a praia de Perranporth, na Cornualha. Aí, o impacto dos invernos extremos de 2013/14 e 2015/16 causou perdas muito significativas de areia do sistema de dunas e das praias intermareais. No entanto, em 2018 a praia tinha ganho 420.000 metros cúbicos de areia.

Uma das questões chave que os gestores costeiros e os cientistas enfrentam prende-se com o quanto uma linha de costa pode mudar devido à subida do nível do mar, enquanto é planeada a resposta aos impactos crescentes das alterações climáticas.

Assista o vídeo no link: https://youtu.be/WAv-c9zNCWM 

A regra de Bruun tornou-se obsoleta

No passado, utilizava-se uma abordagem simples conhecida como "regra Bruun", que afirma que para um dado metro de subida do nível do mar, espera-se que a linha costeira recuasse entre 20 e 100 metros ou mais, dependendo do declive. Através da regra de Bruun, projetou-se que a subida global do nível do mar causada pelas alterações climáticas causaria um grande recuo ou perda de quase metade das praias arenosas do mundo até ao final deste século.

"No entanto, a regra de Bruun tem sido criticada pela sua simplicidade, uma vez que não tem em conta os muitos fatores complexos de como as praias individuais respondem à subida do nível do mar" - Gerd Masselink.

Um desses fatores é a presença de areia armazenada em águas profundas ao largo da costa, e o seu potencial de deslocação durante eventos climáticos extremos. Os autores do estudo acreditam que tempestades extremas também devem ser consideradas nas projeções a longo prazo do movimento de sedimentos nas praias.

O recuo das linhas de costa

As regiões costeiras estão cada vez mais ameaçadas por diversos fatores, entre eles a subida do nível do mar.

O desafio das alterações climáticas precisa de ser enfrentado através de abordagens e instrumentos integrados e baseados nos ecossistemas, tais como a gestão costeira integrada.

Alterações climáticas e linhas de costa

As alterações climáticas ameaçam as zonas costeiras, que já se encontram sob tensão devido à atividade humana. A subida do nível do mar altera a forma das linhas costeiras, contribui para a erosão costeira, destruição gradual da terra pelo mar e leva a inundações e a mais intrusão subterrânea de água salgada. Os oceanos mais quentes e mais ácidos também são suscetíveis de perturbar os ecossistemas costeiros e marinhos.

A erosão costeira tem-se verificado por todo o globo, ameaçando assim as zonas costeiras. Por exemplo na Europa, um quinto da costa já está severamente afetada, com as costas a recuar entre 0,5 e 2 metros por ano, e em alguns casos mais extremos até 15 metros. A erosão costeira tem efeitos dramáticos sobre o ambiente, ameaça habitats e vida selvagem e sobre a atividade humana, como é o caso do turismo.

Durante décadas, as áreas costeiras têm experimentado intensa urbanização e forte crescimento populacional. A União Europeia adiciona cerca de 68.000 km de costa, três vezes mais do que os Estados Unidos. Segundo a Agência Europeia do Ambientequase metade da população da UE vive a menos de 50 km do mar. Além disso, a costa é o destino de férias mais popular da Europa.

Para que os decisores políticos tomem as medidas adequadas, é importante compreender melhor os efeitos das alterações climáticas nas comunidades e recursos costeiros, pelo que a realização de investigação, recolha de dados e monitorização do estado das costas são essenciais.

Medição do recuo das linhas de costa

Dadas as constantes mudanças nas zonas costeiras, os satélites de observação da Terra são uma ferramenta útil e imprescindível para melhor as monitorizar e compreender, dada a observação frequente que fazem da Terra.

Os satélites de observação da Terra tornaram-se ferramentas científicas poderosas para entender melhor a Terra e a atmosfera.

Agência Espacial Europeia, ESA, tem vindo a desenvolver vários produtos para melhor monitorizar a Terra e a atmosfera. De acordo com o programa de Ciência da Observação da Terra, da ESA, o projeto “Coastal Change from Space” fornece informações importantes sobre as alterações costeiras em todo o mundo e permite um serviço global de monitorização da erosão costeira, avaliação dos riscos ambientais, e investigação sobre o potencial impacto das alterações climáticas na costa, incluindo a subida do nível do mar e o efeito de sistemas meteorológicos cada vez mais dinâmicos.

Aproveitando imagens de satélite recolhidas ao longo de 25 anos, incluindo dados das missões Sentinel-1 e Sentinel-2 do Copernicusa equipa mapeou 2.800 km de litoral analisados em quatro países: Reino UnidoIrlandaEspanha e Canadá. Com os novos desenvolvimentos é possível que cada pixel de cada imagem de satélite tenha muito mais precisão no solo, bem como para identificar onde o litoral está localizado em cada data específica.

Confira imagens no link da ESA EarthObservation abaixo:

https://twitter.com/ESA_EO

A frequência das imagens das missões Sentinel-1 e Sentinel-2 tornou possível observar as mudanças ocorridas nas linhas costeiras. Estes resultados foram validados por uma equipa de cientistas independentes dos quatro países usando dados de observação de campo e conhecimento local. As 30.000 imagens obtidas estão a ser analisadas para ajudar os cientistas a entender melhor os processos locais nas regiões costeiras.

A próxima etapa será usar estes conjuntos de dados para melhorar o desempenho de modelos e adicioná-los a outras informações morfológicas sobre áreas costeiras para melhorar as previsões e facilitar o uso de estratégias de mitigação fundamentadas.

FONTE: tempo.pt









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