Qual a diferença entre a engorda artificial e a engorda natural numa praia?

What’s the difference between artificial fattening and natural fattening on a beach? 


Como funcionam a engorda artificial e a engorda natural numa praia. Comparando resultados entre as duas soluções de engenharia obtidos no Nordeste do Brasil.


Engorda artificial da praia de Piedade, Jaboatão dos Guararapes/PE.              Foto: Jadson de Pádua

Os efeitos das mudanças climáticas sobre as regiões costeiras promovem processos erosivos nas áreas urbanizadas. O litoral do Nordeste tem sofrido com ressacas cada vez mais fortes, as ondas avançam sobre ruas, casas e comércios. As ressacas das marés e a elevação no nível dos oceanos contribuem decisivamente para o aumento da erosão marinha no litoral do Nordeste.

É preciso buscar maior eficácia nas obras de contenção costeira, procurando encontrar nas soluções de engenharia a recuperação da praia natural recreativa. É preciso ação para conter a erosão costeira. As cidades litorâneas precisam de adaptação para enfrentar as marés atuais e futuras, frente as mudanças climáticas.

Embora a construção e monitoramento não façam parte do processo de planejamento e projeto, eles devem ser considerados antes do projeto final.

Todo projeto de engenharia para proteção costeira, independente da solução técnica a ser adotada, deve-se observar de forma concomitante cinco itens: custo de implantação; custo de manutenção; disponibilidade do material; impacto ambiental e durabilidade.

O grau de vigilância no acompanhamento do pós-obra depende da forma como os dados devem ser usados. Existem dois tipos básicos de acompanhamento:

O primeiro tipo é para conformidade da construção do projeto e para avaliação do desempenho do projeto.

O segundo tipo é muitas vezes negligenciado. É preciso especificar claramente a necessidade de um plano de monitoramento e um plano de operação e manutenção. Os planos devem ser preparados como parte de cada projeto, para que a responsabilidade sobre a obra seja mantida. Isto é essencialmente importante em projetos de engorda artificial de praia, para determinar quando a realimentação do aterro será necessária. Além disso, dados sobre o desempenho do projeto são necessários para a melhoria contínua e refinamento dos modelos de previsão para projetos costeiros.

Por que as ressacas acontecem?

As ressacas são eventos repentinos que ocorrem nos oceanos devido a elevação do nível do mar. Costumam ser mais comuns durante o inverno e a primavera, quando frentes frias e ciclones extratropicais se formam com maior frequência, mas podem acontecer em qualquer época do ano. Quanto mais forte o vento, maior será a altura das ondas que chegam à costa.

As praias abertas estão mais vulneráveis a destruição em áreas urbanizadas. O formato do fundo marinho e a direção em que a praia aponta, também são fatores que influenciam.

A ressaca é um processo natural, a ação humana aumentou a intensidade desses eventos globalmente com as mudanças climáticas e localmente com a construção de portos, obras costeiras e a ocupação imobiliária nas orlas. As obras costeiras mal resolvidas no litoral na maioria das vezes, destroem a paisagem natural contribuindo para uma destruição de proporções ainda maiores.

Como funciona a engorda artificial?

O alargamento de faixa de praia ou engorda artificial de praia, tecnicamente conhecido como aterro artificial de praia, é uma obra de engenharia para proteção costeira, para evitar ou reduzir a erosão da linha de costa. A técnica consiste na colocação artificial de areia preferencialmente de mesmo tamanho, densidade e granulometria do material original da praia. O principal objetivo da obra é preservar, alargar ou formar praias e dunas compensando a erosão verificada, aumentando a largura da praia. Geralmente a alimentação artificial é utilizada associada a outras obras de proteção costeira de forma complementar tais como: espigões, quebra-mares e molhes. O objetivo dessas obras complementares é aumentar o tempo de retenção dos sedimentos na praia, prolongando o tempo para reposição periódica de sedimentos para manter a faixa de praia.

Teoricamente toda praia com processo erosivo poderia utilizar o alargamento da faixa de areia, entretanto, o alto custo da obra, as dificuldades de atendimento aos parâmetros de projeto e as incertezas quanto à durabilidade da intervenção, são fatores limitantes para sua utilização.

Outro componente que deve ser observado é o impacto ambiental decorrente da obra. É imperativa a realização de Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) bem fundamentado, indicando o monitoramento obrigatório da obra antes, durante e depois da sua conclusão.

Não existe solução única para contenção de erosão costeira. Indicar o alargamento de faixa de areia para qualquer praia é uma opção de difícil eficácia.

Em 2013, foi feita uma engorda artificial em Pernambuco, no município de Jaboatão dos Guararapes, foram colocados um volume de 850 mil metros cúbicos com um custo de R$ 41,50 milhões. Após cinco anos da obra, alguns trechos voltaram a ser engolidos pelo mar, em outros a água ficou empossada. Havendo necessidade de manutenção da praia.

O monitoramento do pós-obra é de responsabilidade do município, que também é responsável pela manutenção do aterro artificial da praia.

Como funciona a engorda natural?

Atualmente muito se discute sobre a eficácia das obras de defesa costeira, principalmente considerando  os efeitos das mudanças climáticas, o que aumentará a demanda por essas obras. Com esse cenário, se faz necessário uma nova abordagem exigindo novos conceitos na definição de obras de defesa costeira com o objetivo de promover a recuperação de praias.

No ambiente costeiro, os ventos são os grandes responsáveis pela dinâmica costeira, seu papel não se restringe a originar ondas, e por conseqüência, as correntes litorâneas. As ondas e as correntes marítimas transportam grandes quantidades de grãos de areia que são parcialmente depositados na praia. A areia acumulada e exposta ao ar, após seca, é transportada por ventos dominantes para locais mais elevados da praia. Grandes quantidades de areia se deslocam ao longo das linhas de costa.

As praias e as zonas costeiras são as regiões onde se faz sentir a ação energética do mar sobre os continentes. É como se a costa fosse um atrator caótico. Em regra, é a costa o obstáculo sobre o qual a onda acaba por dissipar a totalidade da sua energia, num processo extremamente complexo, genericamente designado por rebentação. A praia é o grande dissipador de nergia das ondas, essa é a concepção básica dos dissipadores de energia numa praia (Souza,2020).

Em Alagoas, foram construídos dissipadores de energia de ondas com uso de geossintéticos desde 2003 para proteção costeira. O uso de dissipadores de energia em oito praias do litoral alagoano, sendo todas elas em condições completamente distintas do ponto de vista geográfico, geológico, morfológico e hidrodinâmico, onde o resultado final foi a contenção do avanço do mar sem transferir o processo erosivo para áreas adjacentes, a recuperação da praia com a recomposição do perfil devido à engorda natural, e a facilitação do acesso da população à praia natural recreativa, indicam a necessidade de expandir a experiência para outras praias.

O dissipador de energia funciona como um anteparo que contém o avanço do mar no local da erosão, dissipando a energia do trem de ondas que incide sobre sua estrutura reduzindo sua velocidade, e com isso promovendo a recuperação do perfil da praia no local da intervenção. A estrutura utilizada fica enterrada, garantindo o acesso à praia natural recreativa, o resultado é um baixíssimo impacto ambiental na paisagem e no meio ambiente. 

Os geossintéticos, quando bem projetados e aplicados nas obras de proteção costeira se apresentam como uma solução eficaz, tanto na contenção da erosão costeira como na recuperação de praias em áreas urbanizadas.

Onde reside a diferença entre as engordas artificial e natural?

Já reparou nas formas do litoral? Será que existem ilhas quadradas?
A modelagem da linha de costa deve-se a um conjunto de forças complexas que atuam no ambiente costeiro, formando o padrão existente.

A primeira diferença é visual entre as duas obras.


Praia de Piedade: A engorda artificial da praia mostra o formato retilíneo da costa. O mar vai avançando com o tempo formando a berma e recuando a faixa de areia na praia. Jaboatão dos Guararapes/PE.              Foto: Jadson de Pádua (fevereiro/2021).

Praia do Marceneiro: A engorda natural da praia após a construção do dissipador de energia Sandbag, mostra o formato natural e não retilíneo da costa. Após a construção da obra, a praia vai emergindo, o mar vai recuando com o tempo, a berma natural vai sendo formada e a vegetação de restinga volta e recuperar a paisagem local. Passo de Camaragibe/AL.              Foto Autoral (fevereiro/2021).

A diferença visual entre as duas engordas é o seguinte: Na engorda artificial o formato da linha de costa é retilíneo, diferente da engorda natural induzida na praia, pelo uso do dissipador de energia. A feição da praia se harmoniza com o ambiente, isto é, a modelagem da linha de costa não é retilínea, ela é modelada naturalmente pela dinâmica existente no local.

 A segunda diferença é o custo de implantação e manutenção das respectivas obras costeiras.

O custo de implantação da engorda artificial é 10 vezes maior que o custo de uma engorda natural. O custo de manutenção da engorda natural é 20 vezes menor que o da engorda artificial. Em 2019 o alargamento de faixa de areia na praia de Iracema, em Fortaleza, teve um custo de implantação de aproximadamente R$ 50 milhões/km.

 

FONTE: MARCO LYRA




Comentários

Mais visitados