Mudanças climáticas transformarão 200 milhões em “refugiados do clima” até 2050


 

Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real | Fotos Públicas

Por Edmond Sakai

Líderes dos 193 países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) se reuniram em Nova York para a 76ª Assembleia Geral das Nações Unidas. Com o mote “Construindo resiliência por meio da esperança”, os principais temas do encontro são a resposta à pandemia da COVID-19 e os desafios das mudanças climáticas e de como construir um mundo mais ambientalmente sustentável, respeitando as necessidades do planeta e os direitos das pessoas.

A preocupação com as consequências das mudanças climáticas causada pela emissão dos gases que causam o efeito estufa aumentou ainda mais após a divulgação do mais recente relatório do Painel Internacional de Cientistas do Clima (IPCC, na sigla em inglês), no início de agosto. O relatório alerta que as mudanças climáticas já são uma realidade que estão afetando todos os continentes, se espalhando rapidamente e se tornando mais intensas. Utilizando tecnologias mais avançadas para analisar os padrões climáticos do passado e do presente e projetando o futuro, os cientistas podem prever com mais exatidão as próximas décadas. E o cenário não é nada bom.

Eventos extremos serão mais comuns

Eventos climáticos extremos como secas, inundações, furacões e vendavais, assim como ondas de frio e calor extremos já estão se tornando mais comuns, como estamos observando em diversas regiões do mundo neste ano. Inclusive no Brasil, com a seca recorde que ameaça os reservatórios de grandes usinas hidrelétricas e a segurança energética. E elas só irão se tornar mais comuns e intensas nos próximos anos, mesmo se conseguirmos reduzir as emissões de carbono e outros gases a níveis que impeçam a concretização do pior cenário, da temperatura média mundial subindo mais que 2°C.

Os cientistas frisam que esse aquecimento médio é apenas isso, uma média, e o impacto do aquecimento é muito diferente dependendo de cada região do mundo. Ou seja, algumas regiões devem esquentar bem mais que outras. As regiões mais próximas aos Polos e, portanto, mais frias, por exemplo, devem ter uma média de aquecimento bem superior.

Esse aquecimento gera um efeito em cadeia com graves consequências. Entre elas, está acelerar o ciclo da água, o que gera mudanças nos padrões de precipitações de chuva, causando tempestades mais fortes e mais inundações, como também secas mais severas. Isto tem impacto direto na agricultura e na segurança alimentar de bilhões de pessoas. Áreas costeiras vão sofrer com o aumento do nível do mar, causando inundações em áreas mais baixas e erosão costeira. Os oceanos ficarão mais quentes e ácidos, afetando a vida marinha e atividades como a pesca. Nas cidades, as ondas de calor devem se intensificar, assim como inundações e ameaças ao suprimento de água e energia elétrica.

Mais pobres serão mais atingidos

O que mais me angustia, é que as regiões em que vivem os mais pobres, que menos contribuem para a emissão dos gases de efeito estufa, são as que serão mais afetadas. Essa população, que já vive em condições de grande vulnerabilidade, ainda arcará com a maior parte do custo humano das mudanças climáticas. O acesso a água potável e comida ficará ainda mais difícil, o que forçará centenas de milhões de pessoas a se deslocarem de onde vivem em busca de melhores condições em outras regiões. Segundo o relatório Groundswell, divulgado pelo Banco Mundial agora no dia 13 de setembro, o número de pessoas que precisará se deslocar dentro de seus próprios países deve chegar a 216 milhões até 2050, sem contar os que serão forçados a cruzar fronteiras.

Os “hotspots” de migração devido ao clima devem começar a aparecer até 2030, e em duas décadas podem fazer até 86 milhões de pessoas a se deslocarem na África Subsaariana, 49 milhões no Sudeste Asiático e Pacífico, 40 milhões no Sul da Ásia, 19 milhões no Norte da África e 17 milhões aqui na América Latina. Aqui no Brasil, a seca que atinge a região Centro-Sul é um grave aviso de que a aparente abundância de água que temos aqui, na porção mais populosa e economicamente desenvolvida do Brasil, é ilusória.

ONGs terão papel fundamental na assistência aos refugiados

É chegada a hora de agir e é importante aos mais ricos, que tem responsabilidade neste cenário, financiar as medidas necessárias para mitigar os efeitos das mudanças climáticas. E para operacionalizar essas medidas e dar assistências a essas centenas de milhões de “refugiados do clima”, o papel das organizações não-governamentais é essencial. Certamente haverá um forte aumento dos investimentos e destinação de recursos para projetos e ações relacionados às mudanças climáticas, e organizações com esse foco devem intensificar muito suas ações. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (UNHCR) já está atento a essa questão e conta com as ONGs para ajudar nesse esforço, e o tema também está sendo tratado pelo Banco Mundial, Fórum Econômico Mundial e outros órgãos multilaterais.

Além da assistência primária a esses refugiados, será preciso muito foco em ações de longo prazo para inclusão econômica e desenvolvimento sustentáveis e resilientes, e estratégias adaptativas para tornar as migrações internas oportunidades para desenvolver economicamente estas regiões e proporcionar acesso a trabalho e renda para as populações afetadas. Há muito trabalho a ser feito!

Edmond Sakai é diretor de RI, Marketing & Comunicação da organização humanitária internacional Aldeias Infantis SOS Brasil. É advogado, foi professor de Direito Internacional na UNESP, professor de Gestão do Terceiro Setor na FGV-SP e Representante da Junior Chamber International na ONU. Recebeu Voto de Júbilo da Câmara Municipal de SP.


FONTE: OBSERVATÓRIO DO 3º SETOR 



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