Os milhões levados pelo mar (Portugal)

O recente périplo do Ministro do Ambiente pela costa portuguesa revelou as actuais intenções do Governo para avançar com demolições nas áreas ameaçadas pelo avanço do mar. No entanto, não está claro quais vão ser os esforços empreendidos para impedir novos licenciamentos de grandes empreendimentos turísticos, obras portuárias e grandes barragens, sendo estes os principais causadores dos problemas do litoral.

No seguimento das tempestades que se fizeram sentir no último inverno e das graves consequências causadas em várias zonas da costa portuguesa, foi levada a discussão do Conselho Nacional da Água no passado dia 14 de ,arço a estratégia para o litoral. Na sua intervenção, o ministro do ambiente, Jorge Moreira da Silva, salientou que o investimento em obras de defesa costeira, como os esporões, e o enchimento de praias com areias dragadas continuará a ser uma das principais estratégias, dando continuidade à prática corrente desde há várias décadas. No entanto, evidenciou a intenção de iniciar muito em breve um conjunto de demolições previstas para áreas onde há construções seriamente ameaçadas pelo avanço do mar, assim como de alterar a lei de bases da política de solos, com erradicação de grande parte dos solos urbanizáveis.

O discurso do ministro representa uma mudança significativa relativamente às políticas defendidas no início do desenvolvimento dos primeiros Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), que canalizaram quase exclusivamente o investimento nas obras de defesa costeira e enchimentos de praias, sem haver uma ponderação cuidada da possibilidade de recuo na ocupação da orla costeira e uma análise de custo-benefício dessa opção. O recuo na ocupação da costa é uma solução cada vez mais incontornável pelo facto de se assistir a uma escalada dos danos causados pela subida do nível do mar, em resultado das alterações climáticas. No entanto, esta opção tem igualmente implicações significativas para o investimento público, uma vez que, para se proceder a estas demolições, tem que haver aceitação e indemnização e/ou realojamento dos proprietários. Para além disso, nas decisões sobre a ocupação da orla costeira parecem haver dois pesos e duas medidas, uma vez que, por um lado, fazem-se demolições de pequenos aglomerados em zonas críticas, como é o caso de S. Bartolomeu do Mar (Esposende), mas por outro lado continuam a ser licenciados empreendimentos turísticos em zonas sensíveis, de que é exemplo flagrante a autorização do projeto Costa Terra sobre a área dunar do Pinheirinho (Grândola).

A discussão dos investimentos a fazer para proteção da zona costeira levanta ainda a questão de quem deverá pagar esses investimentos. A intensificação da erosão costeira é consequência, não apenas das alterações climáticas, mas também da redução da quantidade de sedimentos transportados pelos rios devido à construção de barragens e a diversas intervenções pesadas ao longo da costa, tais como a realização de dragagens para aprofundamento das zonas portuárias, a construção de molhes e outras estruturas que alteram toda a hidrodinâmica costeira. Seria por isso expectável que os custos de proteção e mitigação dos danos causados fossem alocados a esses projetos.

No entanto, nas medidas de compensação dos mesmos nada consta sobre estes impactos nem formas financeiras de os compensar. Por esse motivo, ficaria muito bem ao ministro explicar de onde virão os 396,6 milhões de euros de investimento previstos na estratégia para o litoral.
 
Fonte:  http://www.setubalnarede.pt/

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