O que há por trás do calçadão (Natal - RN)

Gilka da Mata Dias - Promotora de Justiça

Há aproximadamente um ano, constata-se um clamor público voltado para a reparação do calçadão de Ponta Negra, que foi destruído em vários pontos em razão do avanço das marés. O clamor é válido e legítimo! Porém, talvez por desconhecimento, pouco se discute e pouco se reivindica a solução para o real, grave e acelerado problema existente na Praia de Ponta Negra, que abrange, também, toda a Via Costeira até a Praia do Forte: a erosão costeira, caracterizada pelo recuo da linha de costa em direção ao continente, causando o desaparecimento de parte da areia da praia, que é utilizada para recreação.

O efeito mais perceptível da erosão nas áreas urbanizadas é a destruição das construções existentes nas proximidades da praia e é comum a junção de esforços públicos e privados para se angariar dinheiro que, muitas vezes, costuma ser empregado apenas para as soluções tidas como emergenciais. O Estado de Pernambuco é rico em exemplos de obras que serviram apenas para sustentar, refazer ou reparar as construções existentes. Os municípios de Paulista, Olinda Recife, Jaboatão dos Guararapes utilizaram muitos recursos em quebra-mar, pier, enrocamento etc e nada foi suficiente para que o mar continuasse avançando no continente. Depois de muitas experiências negativas e mais de dez anos de tentativas e erros, enfim, foi criado no Estado de Pernambuco um comitê interinstitucional, com a participação da UFPE, que resolveu investir em estudos especializados em dinâmica costeira para solucionar o problema e, em decorrência, atualmente, grande parte do litoral pernambucano está passando por recuperação com medidas efetivas contra a erosão.

A solução para o enfrentamento da erosão, portanto, não pode ser confundida com proteções e reparos das construções que foram atingidas pelas marés. Às vezes, essas medidas chegam até mesmo a agravar o problema da erosão, acelerando a perda da faixa de areia de praia.

Assim, na praia de Ponta Negra, se a população se contentar apenas com a recuperação ou a realização de contenção para manter o calçadão, terá que ter consciência de que a Praia, no futuro, poderá servir apenas para ser contemplada por quem passa no calçadão, já que, provavelmente, não haverá espaço para atividades na areia.

Diante desses esclarecimentos, questiona-se: como o natalense quer a Praia de Ponta Negra? Quer o mar contido por um paredão e um calçadão forte, que sustente todos os impactos das marés que tendem a continuar invadindo o continente? Ou faz questão da faixa de areia, para desfrutar a praia em si? A última opção exige atividades que ultrapassam obras de engenharia de sustentação do calçadão. Demanda investimentos em estudos para se melhor entender a dinâmica marinha e também para resolver de vez a erosão costeira. Uma das soluções já apontadas por experts para evitar a continuidade da erosão da praia é o engordamento, que consiste na identificação de bancos de acumulação de areia que existem dentro do mar para que essa areia seja removida e transferida para a área da praia, possibilitando, assim, um alargamento da faixa de areia. É claro que tanto essa como qualquer outra solução precisa ser aprofundada, discutida com a população e licenciada.

Considerando que a Praia de Ponta Negra representa a identidade paisagística da cidade de Natal, a cultura e a história do natalense, aproveita-se a semana do meio ambiente, que é internacionalmente concebida para reflexões, para questionar: como o natalense quer essa praia?
 
Fonte: Tribuna do Norte

Comentários

O que aconteceu em Ponta Negra foi um desastre ambiental, e o que está sendo feito jogando pedras na praia é um crime ambiental.
A Dra. Gilka da Mata Dias está absolutamente correta. Espero que o pessoal do SOS PONTA NEGRA participe da discussão.
Ponta Negra não merece perder sua praia natural recreativa.
Hammes Dionísio disse…
como inventista e morador nada mais verdadeiro que a frustração causada com o enrocamento da praia de PN comprometeu o paisagismo expõe a saúde dos banhistas em troca de algumas garantia vagas?? Porque não fazer do problema uma solução para o mundo ver!! Vigas ecológicas Hammes.
Caro Hammes, não conheço a tecnologia. Caso tenha exemplos que comprovem a eficácia da obra em condições similares a da praia de PN, talvez haja viabilidade de utilização.
Particularmente recomendo o Bagwall como solução para PN. Entretanto, cabe ao município escolher a solução.

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