Mar continua avançando na foz

PIAÇABUÇU (AL) – As águas translúcidas que caracterizam o São Francisco, na região abaixo de Paulo Afonso (BA), deixam os visitantes maravilhados e os ambientalistas em sinal de alerta. “Isso é água de rio morto, sem sedimento e atividade orgânica”, diz Carlos Eduardo Ribeiro Júnior, coordenador da Câmara Consultiva Regional (CCR), uma instância do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF), e presidente da Sociedade Canoa de Tolda.
Barragens alteraram a vazão do rio e ameaçam o ecossistema. Foto: Soraya Ursine
Ele atribui às sucessivas barragens boa parte dos problemas ambientais. “Com a construção das barragens, a vazão do rio é controlada em função da demanda de energia, em condições que alteram todo o ecossistema”, explica o ambientalista. Segundo Carlos Eduardo, uma das consequências do controle da vazão é a redução do volume de peixes. “Estamos na época da piracema, quando os peixes procuram as lagoas vicinais para a reprodução. Mas o rio, que deveria estar em plena cheia, está vazio, com água insuficiente para a formação das lagoas. Portanto, não há a condição necessária para a reprodução dos peixes e a ictiofauna está comprometida”, afirma.

A diminuição do volume de peixes é confirmada pelo pescador Eribaldo Alves Viana, o Vadinho, 48 anos, morador de Brejo Grande (SE). “Até a uns quinze anos atrás, a gente tirava do rio, toda semana, de 300 a 400 quilos de pilombeta. Hoje, fico satisfeito quando pesco 40 quilos. A gente só sobrevive ainda da pesca porque o preço da pilombeta subiu. Antes eu vendia o quilo a R$ 0,50, agora está entre R$ 7,00 e R$ 8,00”, conta o pescador.

Outro problema gerado pelas alterações na vazão é o avanço do mar sobre o leito do rio, nas áreas próximas à foz. Além de alterar o ecossistema, as águas salgadas estão invadindo ou já fizeram desaparecer povoados ribeirinhos inteiros. É o caso de Cabeço, uma colônia de pescadores de Brejo Grande, visitada pela Expedição Halfeld, em 2001, quando o fenômeno já era registrado. À época, 25 famílias resistiam, recuando suas casas de pau-a-pique à medida que as águas do mar se aproximavam.

Hoje a colônia foi extinta e os antigos moradores se transferiram para dois outros povoados, Cabeço 2 e Saramém, sendo que o primeiro deles já está também em risco. “Tínhamos aqui uns 700 moradores, escola e posto de saúde. Com o avanço do mar, o posto e a escola foram fechados e o povo quase todo já se mudou para Saramém”, diz o policial aposentado Flávio Hipólito Santos, de 64 anos.

Mais um sinal do avanço das águas do mar é a posição do farol. Ele está a cerca de 300 metros do que restou de Cabeço, com mais da metade de sua estrutura submersa. Para o ambientalista Carlos Eduardo, uma das medidas urgentes que devem ser tomadas é a adoção da chamada vazão ambiental no controle feito nas barragens, que reconstituiria as condições encontradas no rio antes da construção das usinas hidrelétricas. A segunda iniciativa é a proibição da pesca no baixo. Os pescadores, propõe o ambientalista, seriam empregados nos serviços de revitalização e preservação. “Afinal, aos impactos das barragens se somam outros, provocados pela falta de saneamento nos municípios ribeirinhos, que depositam seu esgoto no leito do rio, e pela retirada da mata ciliar, feita para a ocupação desordenada e irregular das margens”, afirma.
 
Fonte: http://www.halfeld10anos.com
 

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